sexta-feira, 28 de novembro de 2014

 Sem Graça à Oeste 


  Assim que o nada começou a fazer sentido, alguns dizem que foi logo quando o sol dormiu, ela abriu os olhos. Os cabelos louros já não estavam como antes, um pouco mais apagado, algo para o branco. Mas vivos, como ela pensava. Estava tudo escuro, ela estava presa. Não conseguia nem se virar direito, e estava em meio a um veludo. Precisou de uma força imensurável para empurrar a porta, como pensava. E encontrou apenas terra. Cavou, cavou, foi mais fundo, e chegou a superfície. Estava em seu túmulo. Mármore, frio, flores murchas em volta de sua coroa.
   Ela ficou várias horas, dias talvez, olhando sua cova. Ainda estava lá, deitada, seus cabelos cobrindo todo o ombro. Como era possível? Quem explicaria tal fato? Depois de algum tempo, aparentemente já desistira de contar, começou a chover. As gotas molharam a garota inteira, mas a que estava deitada, ela mesma, não se molhou. Ali, naquele cemitério, a garota ficou pensando em motivos para descer novamente até o caixão e descobrir o que estava acontecendo. E desceu. Quando seus pés tocaram o caixão, lentamente, ela estremeceu, um frio até então desconhecido domou seu coração. Finalmente entendera, aquela era sua alma, não mais a tinha. Como viver sem alma? Como? Lembrou-se então do seu passado, das pessoas com quem poderia contar, das pessoas que poderiam ajudá-la. Deixou então sua alma deitada, e foi em busca de ajuda. Deixou para trás aquelas flores, e o poste de luz que estava aceso ao lado de seu memorial. Memorial... também não sei o motivo.
    Na rua não havia ninguém. Logicamente, quem sairia aquela hora. A lua brilhava tanto. Como sofre! Em toda sua existência, acho que não foi grande coisa, ninguém percebeu seu sofrimento. Mas o brilho nunca foi de alegria. Foi para se esconder. Casais olham para ela, famílias, mães, um grupo de amigos, e ela sempre a mesma. Mas a garota via. Conseguia enxergar sua dor.
   Foi até sua casa. Todas as luzes apagadas. Como pensava, não passava ali por muito tempo. Decidiu então ir até sua família, quem sabe eles teriam alguma resposta. Encontrou todos acordados no meio da madrugada, comendo. Disseram que estavam almoçando, e como estava calor o dia. A menina não entendia nada. Depois de conversar sobre a vida de todos, vida, como diziam, ela sentiu que estava na hora de pedir ajuda, contar sobre sua alma, como estava aprisionada. Mas todo momento que ela tentava contar o fato, uma estaca era enfiada no seu peito e ficava rasgando. Pelo menos foi assim que ela falou. A dor da estaca era tão forte, e ela sabia que caso conseguisse falar sobre sua alma, para qualquer pessoa, esta poderia sentir a mesma dor. "Não quero isto para ninguém", ela me disse uma vez.
   Pela janela conseguiu observar o sol tentar desabrochar no horizonte. Sabia que estava na hora, não poderia deixar o dia chegar e ela continuar ali sem sua alma. Desculpou-se com todos da casa, todos disseram que não foi nada (sem entender nada), e ela saiu correndo. Correu, lágrimas caiam, rolavam por seu rosto, respingavam no cabelo e tocavam o chão como purificação... ou o contrário. Chegou no cemitério, o sol quase impondo seu poder. Entrou na sua cova e ficou junto com sua alma. Ali dormiu. E foi quando nós conversamos. Um mundo paralelo, não sei. Não preciso explicar aqui também, quem sabe em outro momento. Era apenas neve, alguns arbustos formando uma circunferência, uma fogueira centralizada, e nós dois conversando. Estava quente e frio ao mesmo tempo, não sei se dentro ou fora.  E todos os dias foram assim. Noites, na verdade. Quando o sol começava a aparecer aqui, ela corria para o outro mundo. Acordava no seu túmulo, e tudo se repetia.
   Depois de muito tempo nós concordamos em guardar todo o sofrimento de nossas almas conosco, e se possível, mostrar nosso corpo para as pessoas, apenas ele. Foi assim que vivemos, assim que sobrevivemos. Isso, melhor, sobrevivemos.
quarta-feira, 26 de novembro de 2014

Demasiadamente Humano


Encomendaste a morte no gêneses
Perdidos no labirinto da redenção
Humanos escalam o muro abissal
Todos condenados a danação 

Horrores dos demônios infernais
Ligas com os cães da Terra 
Partires o pão aos pecadores
Vendeste fatia por fatia 

Almas condenadas ressurgem 
Condenadas a vida, vida...
Os céus estão preocupados

Aquele humano não vive
Mas está no mundo, sofredores
Peito e navalha aos pedaços
terça-feira, 18 de novembro de 2014

Morte ao Titã!


Quero mais dias no mês,
Com mais horas por minuto
Quero o tempo diminuto
Perto do resto do importante

Quero voar em navios,
Deixar-me levar em Rios,
Degustar quentes e frios
Em apenas 45 segundos

Quero recitar poemas,
Fagocitar aforismas,
Explodir-me em várias centenas!
Em meio piscar de olhos

Ame-me sua vida em 2 segundos
Desperdiça teu tempo. Matamo-no!


domingo, 16 de novembro de 2014

Horizonte


Oh deusa, aproxima-se sobre os mares
Flutua perante os olhares perdidos
Entre a perdição do horizonte se inclui
Calíope, deusa minha, vive por qual glória?

Tínheis crido no mais elevado altar
Nada é tão estático, uno
Nem os pássaros que acompanhava
Ferrugem agora é um modo de vida

Caronte peca para seus seguidores
Guia até os menores,
Sofre para a inexistência. 

Rainha das iguais, ajuste-se
Caronte não é mesmo
Nós começamos a existir. 
quinta-feira, 13 de novembro de 2014

Retratos e Memórias


   Os sinos ecoavam, meu quarto estava surdo. A Igreja no final da rua não casava, continuava a ecoar o sino... mas minha janela está sendo tocada por neve agora, quase coberta. Sem levantar da minha cama, já estava cansada de observar o teto, virei meu rosto. Incontáveis fios amarelos tamparam minha visão, meu cabelo, acho [...] Não queria retirar ele da minha vista, fiquei inerte, até o crepúsculo engolir o dia. Já está na hora? Retirei aqueles fios do meu rosto. Minha cama? Grande e vazia, parecia que a neve ali repousava. Meu quarto, com todas aquelas memórias, encontrava-se só, eu já não contava. Não contava?! Mas eu sou a menina. No fundo, dentro do meu próprio nebuloso vale, eu sabia. Não contava pois eu não era passageira, o quarto nunca me pertenceu, nem eu a ele. Não há como nos separar.
   Enquanto estava deitada em meu mundo, acho que essa é a palavra, prestava atenção nos barulhos da rua. Não quero mais ouvir o sino. Creio que seja uma mãe com seu filho. Tantas trocas de afeto, mas está muito frio. O que faz esses dois lá fora? Quem se importa... acho que pensavam assim. Risos, acho que era, duas pessoas brincando lá fora. Provavelmente bolas de neve, como uma guerra para aliviar o mundo. Ou talvez um boneco, sabe, daqueles com nariz de cenoura, moldá-lo como desejar, desfazer quando quiser, ou deixar o inverno passar, o tempo levará. Um carro também passou, mas era só um carro.
   Depois de algumas escolhas, passou pouco tempo, sentei na cama. Esqueci que a janela estava coberta de neve, mas olhei para ela. Ouvi passos na escada de casa. Fiquei esperando os passos acabarem, mas não acabou.
   Chegou um momento em que eu deitaria novamente ou sairia por aquela porta. Não defini como uma escolha certa, mas atravessei a porta. A escada me encarava. Vazia, com um espelho no final. Fui até o espelho, fiquei ali por um período. A  imagem, minha imagem, pele pálida, olho azul (é o que todos dizem), e... não sei. Atrás apenas a escada e a porta do meu quarto aberta, como um convite. Fechei meus olhos rapidamente. Quando abri, para minha surpresa, juro, eu ainda estava lá.
   Resolvi ir até a rua, ver aquelas pessoas. Foi complicado abrir a porta, a neve não deixava. Tive que fazer muita força para conseguir, e no final consegui.  Se foi bom ou ruim é com você. No exato momento em que abri, as vozes pararam. Mas o sino continuava. Primeiramente pensei que estavam calados, mas depois percebi que nunca houve alguém.
   E a Igreja com seu sino? Vou pará-lo. Corri, o crepúsculo já estava sendo engolido. Quase perto da esquina da Igreja, tropecei em uma pedra e caí. Já consegui ver ali do chão. Não era uma Igreja. Era um velho balançando um sino. Fui até ele e fiz algumas perguntas. Mas ele não fez nada além de tocar o maldito sino. Desculpe-me a palavra. Desisto daquele senhor? Não fiz, apenas o esqueci. Mas voltei a visitá-lo. Retornei até o meu quarto, deitei novamente. Olhei para o lado, como sempre não havia ninguém. Dormi.
   Os sinos ecoavam, eu estava surda.
segunda-feira, 10 de novembro de 2014

Vitalidade II: Sobre a Escada



A Escadaria continua parada
O tempo não importa para ela
Ela, a menina, importa

Estático em um tempo tortuoso
Plano, sensato, sem vida
O sangue já faz parte dela

Deixem a menina na escada
Não cuspa seus desejos sobre ela
Não desmorone seu mundo,
Ele não é único.

A pequena saiu da escada
Foi até a floresta
Ficou lá um bom tempo
Ela não o contou

Mas o Natal chegou lá também
Não dava para acreditar
Obrigam a escada a permanecer

“Deixe a menina sentada ali
Ela vai esquecer que é uma escada”
Era uma escada, realmente
Mas "só" nunca foi real 
sexta-feira, 7 de novembro de 2014

O Médico e O Monstro



É estranho
Está tudo bem, mas tudo errado
Deveria encolerizar-me mais...
Com sociedade anti-social,
Com política idiota

Ah, maldita política!
Infernal humanidade desumana! Não.
É estranho achar o normal errado? 
Talvez devesse eu amar mais
E mostrar isso de vez em quando

Mas o que fazer?
Demonizar guarás satânicos?
Louvar burros sagrados?
Perguntar o sentido da vida a mortos...
Ou simplesmente pensar?

Ah, o pensar... Fardo!
A arte matemática de pensar humanamente,
Este dom que a tantos aflige,
A mim causa delírios de lírios e rosas
Oh, apesar, estou farto!

Já declarei meu amor pelo conhecimento
Não sou filósofo, sou... humano
Mas não somos mais humanos
A esmeralda está em nós,
E nós somos todos Monstros

Meu Gato, para falar de amor


Não quero poesia.
Só quero lembrar do meu gato.
Não procurem versos e palavras
Apenas pensem nele... então vamos

Costumava usar essa droga
Mas meu gato me fez parar.
Meu pequeno gato preto...
Sacrificou-se por mim.

Nos dias de chuva
Ele está aqui.
Mas não para de chover, senhor.
Meu gato perdia outra vida.

Estava na praia, em dezembro.
Algo que desconheço me afogou.
Mas ele também lá estava,
E foi com o Oceano.

Meu gato perdeu as Sete
Depois de três dias,
Ele não voltou.
Seu gato não existe! - a menina nadando

O gato... meu gato
Ensinou-me a não implorar
Mas sinto sua falta,
Não falo a língua dos homens. 
quarta-feira, 5 de novembro de 2014

Onde anda seu coração?


Descobri-me esses dias vagando dentro do peito. Um coração.
Eu lá sabia que coração vaga?
Entretanto, descobri um novo prazer
E deliciei-me nas aventuras de conhecer outros mundos

Mundos tristes, mundos vermelhos, mundos amarelos, muitos diferentes do meu!]


Enquanto isso, meu coração pulsava

E palpitava de alegria
Mas, meu coração que aprendia a dar seus passos,
Descobriu os tropeços
Aos poucos, descobrimos juntos, eu e meu coração, que há caminhos
Com falhas
Caminhos que tem muitas curvas
E veias muito apertadas
Corações sofridos...
Choramos.

Porém, em meio a tantas descobertas
Escolhemos descobrir
Andamos por mais pulso e mais cor
E descobrimos colorindo o colorido que é
Ser cor na vida de alguém.
Decidimos. Pulsaremos.
E você que pensa que coração não anda
Onde anda seu coração?
terça-feira, 4 de novembro de 2014

Música e Cores


Finalmente, em casa
De volta, embriaguez
Olhamos o céu
Transportamo-nos

Olhares celestes
Com gotas de azul
Bebemos as nuvens
Elevamo-nos

Nadamos em mares
Trocamos olhares
Flutuamos nos ares

É transcendental...
Momento sublime
Sublimamo-nos
domingo, 2 de novembro de 2014

O Sepulcro da Flor


Todos caminham, sem conversa
A cova está cada vez mais próxima
Logo, livre... Quem está feliz?

A gota desce no rosto da menina,
Não é uma lágrima,
É apenas o orvalho,
Já aconteceu.

Olhem aquele menino!
O que faz em tal mortório?
Ele chora pela Flor.

"Ingênuo... não assistiu ao jornal"
As estrelas em seus olhos
Mostram o nada dentro

O menino, ele não é protagonista.
Mas então, quem... "Silêncio!"
Começaram a rezar 

Todos esperavam,
O renascimento da Flor.

O garoto foi expulso,
"Não deixava o nascer"