quinta-feira, 12 de março de 2015

   O Crepúsculo da Vida 


   Durma... Durma... Não passa de árvores. Veja a sombra, as folhas balançando, o galho está batendo na janela. O dia já está para renascer, se prepare. 
   Então acordei. Voltei pra lá, ali pertencia, quero ser livre. Não condenada. Olho no espelho e vejo sombra. Como o galho na janela. Meus cabelos do loiro mudavam para o cinza, acho que sumirão depois de um tempo. Mas para aquele dia, esse dia, eu realmente deveria ter me preparado. Mas como me preparar se hoje é ontem, e o amanhã é agora. Nos preparamos para o inevitável. E quando chegar, tentaremos evitá-lo. Mas nesse dia resolvi sair. Estava frio, o gramado liso, coberto por uma fina camada de neve. O orvalho estava lá, escorregando melancólico, escondendo-se no dia. 
   Fui até o lago. Estava distante. O sol, ocupado, estava no fundo, nascendo. Então avistei no meio de um pequeno arbusto um gato. Vi que ele tinha seus olhos fixos em mim. Chamei-o. Ele pulou para fora do arbusto, seus pelos pretos brilhavam. Aquele gato não tinha mais vidas, ele vinha do oeste, estava liberto. 
   Começou a chover. Minha pele queimava. Estava tudo parado, estático. Então o gato foi se aproximando. Pulou por cima de algumas pedras, até entrou na água em certa parte do caminho. E chegou perto de mim. A chuva não parou, estava do mesmo modo. O dia fugiu. Mas eu já não me queimava. O gato estava comigo. Não sei se estava feliz, não sei se eu estava feliz, mas ali eu sobreviveria. Sabia disso, já não estava afundando. Afundando. Já estava no centro do lago. Algum tempo se passou, e eu não pertencia aquele lugar. Será que você pode consertar o caminho? Ele me olhava fixamente. Sentia a angústia em seu olhar, não podia impedir que eu me afogasse. Eu teria que sair do lago sozinha. Então algo me puxou. 
   E lá estava a dama que eu conheci em um banco eu um dia parecido com este. Ela estava sobre as algas, mas estava molhada. Ela estava molhada. Isso significava muito pra mim. Em minha existência, acho que posso chamar assim, as pessoas não se molhavam. Apenas apareciam secas. Antes de qualquer movimento, percebi que não estava respirando. Mas não me preocupei. Mergulhar aparentemente não faz mal, afundar entre as algas apenas me deixa aparte do mundo. Esta sensação não é tão ruim. Mas eu faço parte do mundo, não? Há mundo ainda para fazermos parte. Então ali poderia me esconder. Não sei se chegará um dia em que eu não vou conseguir sair novamente. Como disse, o amanhã já é agora. Mas tentarei, tentarei até não existir sentido. Tentarei moldar um sentido. Tentarei. 
   Saí da água, continuava chovendo. O gato me esperava do outro lado. Fui até ele. Já não era o mesmo, envelhecera. E o dia nascia, como o mesmo.

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